GRUPO DE TEATRO CHICO DANIEL

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quarta-feira, 5 de maio de 2010

Claus 2 (Um Conto de Natal à Stephen King)

Anoiteceu.
O sino gemeu.
Não tanto quanto eu, é claro, quando coloquei a pá no chão e me apoiei nela, depois de cavar por duas horas.
Um mau escritor diria que as órbitas vazias me olhavam.
Mas órbitas vazias não olham e nem o pior dos escritores estaria aqui como eu, às três da manhã, desenterrando um corpo em um cemitério municipal.
Ela devia ter sido uma mulher bonita, a julgar pela foto preto e branco na lápide.
Entre a estrela e a cruz, contavam-se 27 anos.
Mas os quatro meses decorridos desde seu falecimento tinham feito um belo estrago.
Prendo a respiração, o que é inútil face ao terrível cheiro de carne em putrefação.
Abraço o cadáver para tirá-lo do caixão. Vermes caem em minha vasta barba branca.
Dobro o corpo o melhor que consigo e o coloco em meu saco.
Aquele cheiro, imagino, deve inutilizar meu saco para sempre, sem falar de meu uniforme vermelho.
Olho para os lados, checando se alguém me observa, e então corro o máximo que consigo até meu transporte. Estou cansado. Velho demais para esse trabalho.
As renas reclamam do meu peso e do cheiro quando finalmente sento-me no trenó. Chicoteio-as e alço vôo.
Meu destino é a casa do Pedrinho, o pequeno órfão de 7 anos que se comportou bem o ano inteiro e que pediu ao Papai Noel que sua mãe passasse o Natal com ele.
Entro pela chaminé e ajeito o corpo o melhor que posso na poltrona da sala.
Moscas varejeiras começam a cercá-lo, com um zunido irritante.
Tento endireitar o corpo, mas, sem firmeza, ela cai para os lados.
O tempo é crucial.
Não dá para fazer melhor.
Olho o corpo da mãe do Pedrinho na poltrona e congratulo-me por mais um serviço bem feito.
Saio.
Quando as renas começam a voar, ouço um grito histérico e infantil vindo da casa.
Porra, essa criançada de hoje reclama de tudo…

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